Amor, traumas e repetições: como romper padrões em relacionamentos?
- isadora delfino
- 27 de fev.
- 3 min de leitura
Atualizado: 28 de jul.
Os nossos relacionamentos são como espelhos. Neles, nos vemos com mais nitidez, não apenas na luz suave dos momentos bons, mas também nas sombras que revelam nossas dores e memórias mais profundas. Muitas vezes, o que interpretamos como destino ou coincidência é, na verdade, a repetição de padrões emocionais que carregamos desde a infância - marcas de experiências passadas, percepções inconscientes e feridas que, mesmo sem percebermos, orientam nossas ações, comportamentos e escolhas afetivas.
Por que algumas relações podem nos machucar tanto? Por que, em certos momentos, nos sentimos inseguros, inadequados ou insuficientes ao amar e ser amado? A resposta pode estar nas histórias que trazemos conosco sobre o amor. Os vínculos criados ao longo da vida, a maneira como aprendemos a receber e oferecer afeto e os traumas e valores que assimilamos, deixam rastros no nosso modo de agir e se relacionar. Muitas vezes, sem sequer dar conta, buscamos a repetição daquilo que nos é familiar - mesmo que isso signifique reviver dores e padrões de comportamento que deveríamos ter elaborado e transformado.
Por outro lado, é importante destacar que nossos traumas e padrões de comportamento não são uma sentença, uma vez que podem ser alterados conforme transformamos nossas ações, aprendemos sobre nós mesmos e identificamos o que está por trás daquilo que se repete.
A psicoterapia nos ajuda a decifrar esses padrões, a reconhecer quais dinâmicas são heranças emocionais e quais pertencem ao passado, manifestam-se no presente e orientam nosso futuro. No processo terapêutico, aprendemos que o amor não precisa ser uma luta constante, e pode ir além do medo do abandono, da busca por validação, do preenchimento de vazios e das repetições de traumas emocionais. Na clínica, podemos construir relações mais conscientes e seguras conforme nos percebemos com mais afeto e consideração.
Frequentemente, nutrimos uma percepção irreal e idealizada do amor romântico, entendo-o como algo perfeito, inalcançável e absoluto que vai preencher todos os vazios e lacunas que trazemos conosco. Deixamos de perceber nossas dores e faltas, e não entendemos como acolher as do outro, dada a dificuldade de fazermos isso por nós mesmos.
Amar é um exercício de autoconhecimento, uma jornada onde, ao olhar para o outro, aprendemos a nos ver de forma mais autêntica e generosa também. Em “Tudo sobre o amor” (2000), bell hooks aborda como amor se faz justamente na capacidade de cada um de refletir sobre suas ações, emoções e comportamentos e compartilhar com o outro, acolhendo nossos erros e limitações, juntamente com as dores e fraquezas do outro.
Honestidade, abertura e acolhimento são essenciais para uma comunicação consciente e eficaz no campo afetivo, ainda assim, temos medo. Muito medo. Medo de se abrir e se revelar ao outro em nossa crueza mais íntima, de permitir o acesso à nossa vulnerabilidade, medo de não dar conta do outro em sua concretude de luzes e sombras, medo de perder as ilusões que idealizamos sobre nós mesmos, o outro e o amor.
Nesse sentido, hooks afirma que “escolher ser totalmente honesto e revelar quem somos é arriscado. A experiência do amor verdadeiro nos dá coragem para arriscar. Enquanto tivermos medo de arriscar, não poderemos conhecer o amor” (hooks, 2000, p.185).
Para a autora, quando nos comprometemos com o amor verdadeiro assumimos o compromisso com a mudança, escolhemos a transformação através de um acordo mútuo, que busca revelar a nós mesmos e acolher ao outro que se mostra. É preciso ter coragem para assumir os riscos e se comprometer com a transformação que se opera em nossas profundezas quando estamos em contato com o outro.
O amor exige coragem: de se revelar, de se transformar, de permanecer. Ele acontece na reciprocidade, no diálogo e na aceitação, do outro, de si, e do que nasce nessa troca.
Mas, quando nos comprometemos com o amor verdadeiro, assumimos o compromisso de sermos transformados, de sermos impactados pelo outro de uma maneira que nos permite nos tornar mais plenamente realizados. Esse compromisso com a mudança é uma escolha, que acontece por meio de um acordo mútuo.





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